Um galinha incorrigível. Não existe outra forma de descrever o meu amigo Guilherme. Mas isso era antes. Bem, deixa eu falar como a história começou.
Eu conheci o Guilherme uns dez anos atrás em seu "habitat natural" : na praia. Tudo bem que na época eu também não trabalhava, só que ele ainda era um V.A.S.P.( vagabundo anônimo sustentado pelos pais ), e eu nunca tive essa boa sorte.
Desde aquele tempo, meu amigo se dava bem com as mulheres. Nem todo mundo acredita, mas eu acho que isso tem a ver com a genética. Sim, é verdade, nunca ouvi falar de nenhuma escola que ensinasse sem-vergonhice, cara-de-pau, traquejo e um sorriso nos lábios que encantavam a mais sisuda das garotas. Era um dom que todos invejávamos( sim, eu e todos da "tchurma" que jogava futebol nas tardes das férias e nos dias em que matávamos aula).
Apesar de na época apenas estudar, a família do Guilherme nunca teve muito dinheiro, embora isso nunca fosse problema pra ele. Com sua lábia e uma cara de menino abandonado, aliado a um incrível bom humor, ele era convidado para todas as festas, dormia na casa de todo mundo, era a paixão das supostas futuras sogras e conquistava até os genros.
O engraçado é que essa fase idílica que durou praticamente toda a adolescência, prologou-se pela vida adulta, o que para mim não foi nenhuma surpresa, éramos tão amigos que eu chegava a conhecê-lo como um irmão que nunca tive.
Como ele não gostava muito de estudar, começou por emendar "bicos" atrás do outro, vendedor de shopping, desfiles de moda, pontas na Globo( na maioria da vezes entrava mudo e sai calado para o bem das produções) o que não era nenhum demérito, cada um contribui com o que tem de melhor. Era engraçado ouvi-lo contar pra todo mundo " não perde o capítulo hoje tem uma cena que eu tô surfando."
Claro que isso ajudava a sair com as garotas, mas não era tudo. Ele tinha mesmo um quê a mais e não só com as mulheres. Estava sempre sorrindo, nunca reclamava de nada e vivia como se não houvesse o amanhã.
Gentleman ele não era, o que encantava mesmo era a sua volubilidade. Saía com uma hoje, outra amanhã, namorava uma semana...assim ia o meu amigo Guilherme. Mas nunca soube de nenhuma mentira dele, nesse ponto era leal. Não prometia casamento, nem dizia que era comprometido, nem juras de amor eterno, nem escrevia cartas, muito menos telefonava no dia seguinte, uma memória péssima, não guardava datas nem fazia planos.
Vivia assim como quem não se importa com nada. Ainda assim, conseguia tudo o que queria. Dormia dias fora de casa, na casa de uma namorada nova. Ia pra Minas, Búzios, Arraial e só ligava quando já estava lá e não tinha mais jeito de alguém impedir alguma loucura.
Também nunca soube que tenha transado drogas, ou cigarro nada. Lembrando bem acho que eu nunca soube nem de bebida, isso mesmo, dizia que dava dor de cabeça.
Cansei de saber de garotas que se apaixonavam perdidamente, queriam casar, e ele fugindo como o diabo da cruz, emendando outro namoro, algumas a família até tinha dinheiro, mas ele nunca foi mercenário, nem ligava pra isso.
Por tudo isso é que eu fiquei surpreso com o que aconteceu.
A gente ficou um fim de semana sem se ver, eu acho que estava estudando para uma prova. Quando foi na terça-feira, eu estava dormindo, devia ser umas 7 horas da madrugada quando o telefone tocou, a cobrar. Na hora eu pensei, só pode ser o Guilherme pra ligar uma hora dessas, amigo é pra essas coisas.
Pra mim aquilo tudo era cômico. Meu amigo Guilherme, 26 anos, superior incompleto após vários períodos perdidos, mulherengo contumaz, dorminhoco que só ele, estava casado.
Realmente, não dava pra acreditar e emendei logo um " não acredito." E ele: é verdade Pablo, encontrei a mulher da minha vida, acho que sou o homem mais feliz do mundo.
Continuei não acreditando - Cê tá louco, deu pra beber agora depois de velho
- É verdade, meu brother casei ontem de tarde no cartório.
- Mas como isso foi acontecer ?
- Eu fui numa festa, na casa de uns gringos lá no Alto da Boa Vista, quando conheci a Bruna, uma lindeza cara, vinte aninhos, um sorriso lindo e pensei: tem que ser ela.
- Como assim tem que ser ela ? Eu nunca soube que você estava procurando alguém para casar.
- E não estava mesmo. Eu estava procurando a minha pérola. Sabe Pablo, no fundo eu não era feliz naquela vida de galinhagem, um homem precisa de um porto seguro. Por mais que eu namorasse, eu sentia um vazio muito grande, era como se estivesse faltando alguma coisa. Mas alguma coisa me dizia que existia alguém no mundo que iria me fazer desistir de levar aquela vida. Muitas vezes eu achei que era uma busca inglória, mas finalmente eu encontrei.
- Mas o que o fez ter tanta certeza e por que casou tão rápido, sem festa, sem nada, sem convidar os amigos.
- Foi tudo decisão dela. Quando a vi, perdi todos os sentidos, fui conversar, dei em cima mesmo, como fiz com todas as outras, embora a intenção fosse diferente. E então ela me olhou profundamente e me surpreendeu.
- Como assim ?
- Ela virou pra mim e disse : " Sei tudo sobre você." Você pode não acreditar Pablo, mas era verdade. Quando a vi eu senti uma paz tão grande, não dá pra explicar. Eu precisava estar com ela, tive medo de perder.
- E por isso casou ?
- Nunca tive tanta certeza de alguma coisa na minha vida.
E tem gente que não acredita em destino.